segunda-feira, 23 de maio de 2011

Depois de muito tempo sem açúcar



Segundo dia de ENTRENCONTROS. Neste vídeo o ator Márcio Vesolli lê o texto "Depois de muito tempo sem açucar" de Mariana Coutinho.

"Tenho acordado sempre antes das sete da manhã. Naturalmente. Quarto novo. Nova janela. Jardim. Rua nova. Novos vizinhos. Lanchonete. Café bem quente antes das oito da manhã. Suco de laranja. Melancia. Mamão. Abacaxi. - "Seu Aurélio, por favor, um pãozinho com queijo minas"! Queijo minas? Antes, para mim todos os queijos eram feitos em minas! Ando pelas ruas como se ninguém me notasse. E não notam! Não preciso dizer como foi o dia de ontem e como será o de amanhã. Incrível tocar este lugar! Quando chega a noite, as paredes e o o cheiro do meu novo quarto é o que me traz consolo. É por isso que tenho que agradecer sempre a Deus. O seu quarto me protege. Depois de muito tempo sem açúcar chego em casa à procura de algo um pouco mais doce. Lembro dele chegando em minha casa com um vinho nas mãos e eu debaixo do chuveiro. Depois de anos eu ainda não tinha perdido este costume! Não tinha como ser diferente. A taça entre o indicador e o polegar da mão esquerda tocava levemente seus lábios. Com um abraço me trouxe uma barra de chocolate! Deixei lacrada. Acomodada na bolsinho da mala. Sim. Depois de muito tempo sem açúcar lembro do presente que ele me deu. Amores e amigos se fazem presentes em pequenos gestos. Devoro o chocolate! Afinal, não tenho ainda com quem dividir. Talvez seja essa minha procura pelo afeto. Só pode ser. Doce. Chocolate. Vinho. Qualquer coisa que desloque o calor desta cidade para outro lugar. Se estou feliz? O que poderia dizer se ainda não sei andar pelas ruas desta cidade e ainda assim vou em frente numa velocidade que não me deixa olhar para os lados? Mas ainda assim, olho! Olho e me perco repetidas vezes. Nunca sem coragem. O que eu poderia dizer se aqui tudo é tão simples como o lugar de onde vim? Quando acordo consigo avistar os braços de quem abençoa esta cidade. Abençoa? Para sempre vou acreditar que sim. O que posso dizer se olho pra vida com olhos um pouco mais puros e nada, nada ingênuos? O que posso dizer se acredito absurdamente no meu trabalho exatamente por ser simples. Exatamente por ser sensível. O que posso dizer se sinto uma saudade inenarrável e ainda assim me mantenho diante da linha do horizonte? Às vezes acordo e demoro para entender onde estou. Mas sinto-me corajosa. Por estar aqui. Por amar quem eu amo de longe. Por acreditar e, posso confessar (?), por ter me colocado em risco e ter me jogado assim: de olhos bem abertos sabendo (!?) o que poderia vir a seguir."

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